Uma operação policial no Rio de Janeiro, apelidada de “Contenção”, deflagrada pelas polícias Civil e Militar, resultou em mais de 120 mortes na capital, gerando críticas de organizações de direitos humanos e especialistas em segurança pública. Estes grupos questionam a eficácia e os métodos empregados na ação.
Carolina Ricardo, diretora executiva do Instituto Sou da Paz, argumenta que a operação reflete uma estratégia ultrapassada e ineficaz, que prioriza o confronto violento em vez de soluções estruturais para o crime organizado. Segundo ela, essa abordagem causa caos, aumenta a vulnerabilidade das comunidades e não atinge as raízes do problema. Ela também critica o descumprimento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, que estabelece diretrizes para políticas de segurança pública no estado.
A diretora executiva também aponta falhas no planejamento da operação, incluindo a falta de experiência dos policiais envolvidos na atuação ostensiva e a falta de respeito aos direitos básicos demonstrada pela violência empregada. Ela defende a necessidade de investigar cada morte individualmente, mas acredita que a operação como um todo viola os preceitos da ADPF 635.
Ricardo sugere que um esforço maior deveria ser direcionado para impedir a entrada de armamentos pesados e para desmantelar as estruturas financeiras e de lavagem de dinheiro das facções criminosas. Para ela, ações ostensivas só deveriam ser consideradas após o enfraquecimento desses grupos. Ela acredita que a operação reflete um cálculo político, onde a demonstração de força, mesmo com alto custo social, é vista como vantajosa para as autoridades.
Luís Flávio Sapori, pesquisador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), acredita que a percepção pública começa a reconhecer que os erros da operação não se limitam ao número de mortos, embora ele considere esse número sem precedentes e injustificável. Ele argumenta que a tática de confronto direto e de troca de tiros, com o objetivo de “exterminar” o inimigo, é uma característica da polícia do Rio de Janeiro há décadas, influenciada por sucessivos secretários de segurança, comandantes de polícia e governadores.
Sapori estabelece uma ligação entre a violência policial e a corrupção na corporação, afirmando que polícias mais violentas tendem a ser mais corruptas. Ele alerta que outros estados, como a Bahia, estão seguindo o mesmo caminho. Ele descreve a cena de corpos enfileirados como “dantesca” e “bárbara”, com um impacto profundo nas comunidades.
O pesquisador questiona o fim abrupto da operação e suas possíveis consequências, como a retomada do poder bélico por outras facções ou milícias, e critica a letalidade planejada com o objetivo de “exterminar” membros do Comando Vermelho. Para ele, o sucesso no combate ao crime organizado depende da capacidade de enfraquecer as facções financeiramente, militarmente e politicamente, e de retomar o controle dos territórios dominados por elas.
Glaucia Marinho, diretora-executiva da ONG Justiça Global, visitou os complexos da Penha e do Alemão e conversou com famílias afetadas. Ela descreve a operação como um “massacre” e denuncia violações de direitos humanos, incluindo a alegação de que alguns mortos foram encontrados com braços e pernas amarrados, sugerindo execuções. Ela critica a falta de perícia no local e denuncia as políticas de segurança pública do estado como “genocidas” e “estruturalmente racistas”.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio de Janeiro “repudiou veementemente as ações policiais”, pedindo que o governo permita o controle social e institucional das ações estatais, dentro dos marcos do Estado Democrático de Direito. A Comissão de Segurança Pública da OAB de São Paulo criticou os ataques do governador Claudio Castro à ADPF 635 e pediu investigações rigorosas e independentes da operação, bem como uma revisão urgente das estratégias de segurança pública.
César Muñoz, diretor da Human Rights Watch (HRW) no Brasil, pediu a atuação direta do Ministério Público Estadual na investigação das mortes e na apuração do planejamento da operação. Ele considera que as políticas de segurança deveriam envolver as próprias comunidades e outros atores sociais, priorizando a investigação, a inteligência e o desmantelamento do tráfico de armas e da lavagem de dinheiro.
Fonte: agenciabrasil.ebc.com.br



